#12 Criando seu cinto de utilidades como PM - Parte 1
Seu guia para aprender a tomar as decisões adequadas no seu contexto
Introdução
Nessa segunda bat-newsletter do ano, quero trazer um tema que é sempre muito falado nas comunidades de que participo e que pode te ajudar a planejar seus estudos para 2024.
Pessoas de produto deparam-se o tempo todo com novas metodologias e frameworks se juntando às possibilidades já existentes. Com tantas opções, é obviamente impossível conhecer todas elas profundamente, o que pode te levar à sobrecarga de informações. Entre os fatores que definem a sua senioridade, está a habilidade de decidir quais recursos utilizar em cada momento, além da possibilidade de personalizá-los e combiná-los.
O objetivo deste texto é te ajudar a dar mais um passo no seu crescimento como profissional de produto.
O que você verá e o que você não verá por aqui
Antes de começar, vamos ajustar nossas expectativas?
Eu não vou:
Te ensinar a usar um recurso específico
Te dar uma lista de situações em que você usa uma coisa ou outra
Se você chegou aqui esperando por isso, sinto muito, mas não vá embora ainda. Repare no título do texto: Criando seu cinto de utilidades. Você é quem vai criar, não eu.
Não quero te contar sobre o que eu considero melhor pra cada situação, eu quero te empoderar para tomar as suas próprias decisões, de acordo com o seu contexto, que só você conhece.
Ter segurança para tomar decisões é uma grande parte do trabalho de uma pessoa de produto e, assim como encorajo a autonomia em PMs sob a minha liderança, quero encorajar em vocês também.
Como existem muitos frameworks e metodologias, vamos falar de quatro categorias:
Agilidade
Descoberta
Priorização
Métricas
Ao final, acrescento uma seção bônus sobre cursos.
Definições
No dia-a-dia, utilizamos os termos metodologia e framework de forma intercambiável sem prejudicar a comunicação, mas são coisas diferentes.
Framework significa estrutura. É um conjunto de princípios, conceitos e práticas que orientam as pessoas a definir e implementar uma estratégia de produto. Um framework fornece uma visão geral e uma estrutura lógica para abordar um problema ou oportunidade, mas não prescreve uma solução única ou detalhada.
Metodologia é um sistema ou processo que especifica como as pessoas devem conduzir as atividades e tarefas relacionadas ao desenvolvimento e gerenciamento de um produto. Uma metodologia define as etapas, as ferramentas, os papéis, as responsabilidades e os critérios de sucesso de um projeto ou produto.
Ou seja, frameworks são mais adaptáveis que metodologias. Por um lado, oferecem a vantagem da personalização e se aplicam a uma variedade maior de cenários; por outro, podem ser mais difíceis de implementar.
Uma semelhança é que, para pessoas gestoras de produto, ambos podem ser considerados ferramentas de trabalho, os itens do seu cinto de utilidades, que você vai retirar de lá no momento apropriado.
A maior parte das utilidades que vou citar aqui são frameworks, e o motivo é simples: A flexibilidade dos frameworks contribui com meu propósito de te ajudar a selecionar suas ferramentas de trabalho.
Criando seu cinto de utilidades
Agilidade
É quase impossível falar em produto digital sem falar em agilidade e muitas pessoas ainda confundem os dois conceitos. Na minha opinião, isso ocorre porque a gestão de produtos começou a se popularizar no Brasil a partir da popularização do Scrum, com seu papel de Product Owner.
Sempre vejo pessoas em transição de carreira perguntando sobre frameworks certificações ágeis.
Em geral, enxergo a evolução das pessoas na agilidade com três etapas macro:
A pessoa aprende a usar um framework específico em um contexto específico.
A pessoa entende os princípios da agilidade, consegue fazer algumas adaptações, usar em contextos mais amplos e ter resultados melhores.
A pessoa se aprofunda, aprende a adaptar os processos, gerenciar os fluxos e coletar métricas.
A terceira etapa é o nível das pessoas agilistas (ou agile master, ou agile coach, a nomenclatura varia), a maioria das pessoas PMs não precisará chegar a esse ponto. Minha proposta aqui é inverter as outras duas etapas.
Em vez de focar em um framework específico, aprenda os fundamentos. Leia o Manifesto Ágil até entender o porquê de cada tópico, entenda como eles podem se aplicar no seu dia-a-dia. Dessa forma, você vai preencher o seu cinto com uma série de utilidades que vão além dos frameworks e te ajudarão até mesmo em um contexto de gestão de produtos tradicional.
Depois, se você ainda precisar, escolha um framework para aprender.
Para essa decisão, o primeiro ponto a considerar é o seu objetivo.
Se você trabalha em uma empresa que usa o framework ABCXYZ e sua liderança quer que você aprenda, não existe uma decisão envolvida, você precisa aprender ABCXYZ.
Se precisa saber apenas o suficiente para conseguir um emprego em produto, veja o que está sendo mais procurado pelas empresas que deseja. A resposta pode variar dependendo do segmento, tamanho e maturidade da empresa.
Se sua empresa não tem área de agilidade e você precisa implementar um processo, busque frameworks mais adaptáveis e que te direcionem nesse ponto, como o Kanban.
O Scrum ainda é o framework de agilidade mais conhecido, mas não é o único, não se prenda a ele. Empresas mais maduras já deixaram de utilizá-lo; a maioria das que conheço, usam uma mistura de Scrum com Kanban, que chamamos popularmente de Scrunban. Pessoalmente, sou fã do Kanban.
Se decidir estudar um dos dois, comece por buscar o conhecimento direto na fonte, recomendo os livros de seus criadores:
Scrum - A arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo
Kanban: Mudança Evolucionária de Sucesso para seu Negócio de Tecnologia
E as certificações? Qual você recomenda? Vale a pena tirar CSPO/PSPO?
Não, eu não recomendo certificação de PO para quem quer ser PM, por três motivos:
Agilidade é só uma parte pequena das habilidades que uma pessoa PM precisa adquirir.
Scrum é só um dos frameworks (que já está caindo em desuso).
Essas certificações são caras e, sozinhas, não te agregam muito.
Eu tenho a PSPO, minha preparação foi fazer simulados online até decorar todas as respostas. Há 5 anos, eu achei que fazia sentido, hoje já não acho mais.
“Ah, Cíntia, mas tem empresa que exige.”
Ok, você quer entrar nessas empresas? Você pode dispender esse dinheiro, sabendo que não há nenhuma garantia de que a certificação vai te trazer um emprego? Não há nenhum outro ponto do seu currículo que você possa melhorar?
Obviamente, a decisão é sua e não vou te julgar se você decidir que quer, sim, uma certificação de Scrum. Meu papel aqui é te ajudar a tomar uma decisão mais bem informada.
Descoberta (Discovery)
Antes de falar dos frameworks, vamos lembrar do objetivo de uma descoberta de produto: Mitigar riscos.
Só isso? Só isso tudo.
Existem quatro tipos de riscos que precisam ser mitigados e infinitos frameworks para cada um deles:
Risco de valor
Risco de usabilidade
Risco de viabilidade
Risco de negócio.
Tenho que estudar todos os frameworks? Não.
Assim como na agilidade, antes de decidir o que estudar, você precisa entender o que são esses quatro riscos. Eu não posso te explicar tudo agora de uma , porque, como sempre, o resultado vai depender do seu objetivo.
Sabe aquela música do Skank que diz “eu não posso te ajudar, esse caminho não há outro, não, que por você faça”? É isso, estou escrevendo esse textão todo pra tentar te dar uma luz, mas o caminho é todo seu.
Passada a pausa para ouvir um pouco da minha banda favorita, eu também não vou te deixar só com isso. Posso não te dar as respostas, mas vou te encher de perguntas que vão te ajudar a se orientar.
Se está trabalhando, quais frameworks costumam ser usados na empresa? Se estão funcionando, você pode aprendê-los; se não estão, antes de decidir, entenda onde está o problema.
Quais são seus objetivos de carreira a curto, médio e longo prazo? Como esses conhecimentos vão te ajudar a alcançá-los? Por exemplo, se você quer seguir no caminho da liderança, generalista, faz sentido aprender frameworks muito especializados?
Com qual tipo de empresa você tem mais afinidade? Empresas menores e mais digitais costumam ser mais abertas a colaboração e inovação, enquanto empresas em setores mais tradicionais podem ter processos mais específicos.
Quais são os seus pontos fortes? Use-os a seu favor! Aproveite os seus conhecimentos anteriores nas decisões do que aprender em seguida, principalmente quando precisar de algo rápido.
E quais são os seus pontos de melhoria? Há algum ponto específico em que você precisa melhorar e aprender um framework pode te ajudar?
Como você poderá aplicar o conhecimento na prática? Principalmente se você não estiver trabalhando, pense se é possível aplicar de outras formas e se vale a pena se dedicar a estudar algo que você vai levar muito tempo para conseguir praticar.
Se ainda não faz ideia de como começar, escolha frameworks simples. Eu gosto de usar a Matriz CSD para organizar meus pensamentos no início de uma descoberta, é um dos mais simples. Também gosto do User Story Mapping, que é um pouco mais complexo no início, mas útil em muitas situações. Há vários modelos do tipo Canvas (Business model canvas, Product canvas, Lean canvas, Value proposition canvas etc), se você aprender um, os outros ficarão mais fáceis quando houver necessidade. Otimize seu tempo!
Priorização
De todas as atividades que a pessoa PM realiza, talvez essa seja a mais visível e só porque sempre vai contrariar alguém. Ter um processo claro de priorização pode te ajudar a evitar discussões desnecessárias.
Gosto de classificar os frameworks de priorização em três grupos: Qualitativos, quantitativos e colaborativos.
No grupo dos qualitativos temos alguns dos mais conhecidos, como MoSCoW, Matriz de Eisenhower e Modelo Kano. Os dois primeiros são os mais fáceis de se entender, enquanto o Kano começa a se aproximar dos quantitativos. Em geral, quanto mais qualitativo, mais fácil, mais rápido e também mais subjetivo.
No grupo dos quantitativos, temos uma sopa de letrinhas - ICE, RICE, GUT, WSJF, BUC, Scorecard, Valor x Risco - cada um deles tem suas variáveis, mas todos são muito similares na forma de utilização. Basicamente, você deve classificar cada item de acordo com as variáveis e usar uma fórmula para calcular a prioridade final.
Os colaborativos são as dinâmicas que convidam pessoas de outras áreas para participar. O mais conhecido destes é o Buy a Feature (Compre uma Funcionalidade), em que a pessoa que está conduzindo a dinâmica distribui dinheiros fictícios para as pessoas participantes e elas podem gastar esses dinheiros com funcionalidades.
Vale lembrar que os métodos qualitativos e quantitativos também podem ser utilizados de forma colaborativa. Além disso, nenhum deles é livre de subjetividade.
E agora, como decidir?
Recomendo conhecer pelo menos um de cada tipo. Pode começar pelos qualitativos, que são mais simples, alguns podem ser praticados até nas suas tarefas pessoais.
Dos quantitativos, se você estiver trabalhando, comece avaliando quais variáveis são mais importantes para o seu contexto e o que você consegue avaliar sem passar mais tempo fazendo isso do que executando as atividades priorizadas. Não sabe quais variáveis são importantes? Então escolhe um e testa em um grupo pequeno.
Para quem não está trabalhando, minha recomendação é ler sobre vários métodos e se aprofundar naqueles que você tiver mais afinidade. Eu gosto muito do GUT, por considerar a tendência de agravamento de uma situação, mas tenho mais experiência com RICE.
Com os métodos colaborativos, o raciocínio é parecido, mas mais do que escolher um método para aprender, você precisa aperfeiçoar sua habilidade de condução das dinâmicas. Além disso, é importante considerar a quantidade de pessoas, o nível de conhecimento delas do produto e o nível de engajamento.
Métricas
Por fim, chegamos aos frameworks de métricas, e meu raciocínio aqui é muito parecido com o que expus na seção de agilidade: Se você começa aprendendo um framework específico, você está andando no sentido errado.
Como sempre, a primeira pergunta que você precisa se fazer é “por que?”.
Se você está empregado, por que você quer medir? Mas não se contente com a primeira resposta, pergunte de novo e de novo. Depois de entender o porquê, você você vai começar a enxergar o que precisa ser medido.
Se você está buscando emprego, por que você quer aprender? A resposta pode parecer óbvia, mas não é. Você quer colocar um certificado bonito no currículo? Dar respostas melhores nas entrevistas e cases técnicos? Se preparar melhor para quando conseguir uma oportunidade? Ou algo completamente diferente?
Tendo essa resposta em mente, antes de escolher os frameworks que entrarão no seu cinto de utilidades, comece estudando os fundamentos das métricas. Você precisa entender que existem vários tipos de métricas relacionados a produto - métricas de negócio, métricas de UX, métricas de marketing, métricas financeiras, métricas de agilidade etc.
Depois, avalie que tipo de PM você quer ser e/ou com qual tipo de produto você tem mais afinidade. Se você tem bastante conhecimento de UX ou está em um contexto em que é necessário, pode começar aprendendo sobre HEART. Se o seu objetivo é ser PM com mais proximidade do delivery, as métricas de agilidade são uma boa ideia. Tech PMs podem estudar sobre DORA Metrics, enquanto outros tipos de PMs mal sabem o que é isso.
A empresa em que trabalho hoje não tem um modelo PLG (product led growth), ou seja, o produto não se vende sozinho. Assim, não faz sentido para meus PMs focarem em aprender métricas piratas.
Percebe como só você consegue decidir quais utilidades cabem no seu cinto?
Bônus: Escolhendo cursos
”Que curso de produto vocês indicam?”
Se você faz parte de algum grupo de produto, tenho certeza que recebe essa pergunta várias vezes por semana e é possível que até já tenha perguntado. Assim como em todos os tópicos que falamos hoje, a escolha de um curso depende do contexto, portanto, cada pessoa terá uma opinião. Portanto, é importante que você avalie segundo o que é importante para você.
Não sabe como fazer isso? Não se preocupe, eu vou te ajudar. Aqui estão alguns critérios que você deve considerar nessa decisão.
Investimento: Vamos tirar o elefante branco da sala de uma vez: Quanto você pode investir em um curso de produto? Pense no que você tem disponível, nas formas de pagamento e nas suas expectativas, já que educação é um investimento de alto retorno no longo prazo.
Duração: Ao adquirir um curso, você não estará investindo apenas seu dinheiro, mas também seu tempo. Quanto você pode dedicar por semana? Por quanto tempo o curso estará disponível para você? Esse tempo é suficiente para você concluir? Qual a duração de cada aula?
Formato: Presencial, aulas ao vivo, gravadas, workshops, artigos, projetos - as opções são muitas. Como você prefere aprender? Eu gosto de aulas gravadas e textos, formatos que me dão o máximo de autonomia. O curso que você quer atende a sua forma de aprendizado?
Credibilidade da escola: Entre no site da escola, nas redes sociais, leia os comentários. Verifique se há registros no Reclame Aqui, converse com pessoas que já estudaram lá ou pergunte a lideranças de sua confiança sobre como elas enxergariam um curso dessa escola no seu currículo. Avalie também se a escola está alinhada com seus princípios, se pratica a diversidade, inclusão, sustentabilidade, se tem um impacto positivo na sociedade.
Metodologia: As aulas são apenas expositivas ou há projetos práticos? Os projetos são reais? Como os módulos estão organizados? Nesse ponto, você precisa avaliar tanto as suas preferências quanto a eficiência do métodos. E não se esqueça de checar se os conteúdos são atualizados frequentemente, se há aulas extras ao vivo com temas atuais ou conteúdos exclusivos para alunos.
Corpo docente: Para ensinar produto, é preciso ter prática em produto. Verifique o histórico profissional das pessoas instrutoras, se elas têm bagagem suficiente para ter vivido o conhecimento que querem te transmitir.
Mentoria e comunidade: Haverá pessoas mentoras disponíveis para te apoiar durante a jornada? A escola oferece uma comunidade para estudantes interagirem? Esses contatos são importantíssimos tanto para troca de conhecimento quanto para o famoso networking.
Minha sugestão é que você priorize esses critérios (e quaisquer outros que você venha a acrescentar), descreva o que é inegociável pra você e coloque todas as opções em uma tabela para ter uma visão geral de todas elas.
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Asteriscos finais
Esse texto já está quase ultrapassando o limite, então só quero dizer duas coisas:
Obrigada a você que teve paciência de ler até aqui. Se você gostou, recomende a newsletter para alguém que também possa se interessar. Esse foi um conteúdo que deu bastante trabalho, mas que gostei muito de escrever e espero que ajude.
Vai ter continuação!